terça-feira, 30 de junho de 2009

O QUE É O SIPA

Iniciado pela DGEMN, no tempo de Vasco Costa e integrado na DSID de Margarida Alçada, o SIPA, agora sob a tutela do IHRU, prossegue no Forte de Sacavém a sua actividade, sob a orientação do ex-DGEMN João Vieira.
Sabendo que algumas Direcções Regionais de Cultura se entretêm a recriar bancos de dados do património arquitectónico da respectiva região de influência que já existem no Sistema de Informação do Património Arquitectónico (SIPA), dissipando recursos e energias desnecessárias, julgamos oportuno divulgar o que é o SIPA, retrovertendo o artigo "E se a minha casa fosse património ?" , publicado na revista do IHRU "Causas Comuns", de Novembro 2008.
O inventário do património arquitectónico nacional não é propriamente uma novidade. Começou por ser elaborado há décadas, no seio da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais. Agora sob tutela do Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana, persegue dois objectivos: ser conhecido por um público mais vasto, que pode ter acesso às fichas descritivas pela Internet, e disseminar uma nova abordagem ao conceito de património que começou a ganhar fôlego nos anos 90.

Pode não ser ainda de conhecimento público, mas o Forte de Sacavém alberga oito quilómetros de lombada de registos, desenhos, fotografias, memórias descritivas, entre outros documentos, que atestam – inventariam e arquivam – a existência do património português. Este espólio, bem como o desenvolvimento do inventário e consequente arquivo está a cargo do SIPA (Sistema de Informação do Património Arquitectónico), que é tutelado, desde Junho de 2007, pelo IHRU (Instituto de Habitação e da Reabilitação Urbana).
No entanto, inventário e arquivo do património arquitectónico nacional começaram há quase 90 anos.
Em 1929, fundou-se a Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN), cuja principal missão era a preservação dos monumentos nacionais e da arquitectura pública. Cedo se começou a gerar informação e inventariação patrimonial e, naturalmente, a catalogar e guardar o material em arquivo. Esta actividade manteve-se durante décadas, como uma espécie de consequência da preservação do património.
Durante quase todo o século XX, a principal preocupação era introduzir no inventário o chamado património classificado, nos três níveis de protecção admitidos na lei: os monumentos nacionais, os imóveis de interesse público e os imóveis de valor concelhio.
A partir dos anos 1990, a inventariação e arquivo do património passam por uma transformação a dois níveis: primeiro, os responsáveis da DGEMN, à data, entenderam que o inventário e o arquivo deviam ser prioridades da instituição, intenção que o SIPA mantém.
Segundo, o próprio conceito de património passou a ter um domínio mais abrangente, onde passaram a estar incluídos os edifícios, conjuntos urbanos, paisagens culturais e sítios arqueológicos que possam conter relação com as populações ou mérito na exemplificação de determinado conceito.
O princípio é, essencialmente, passar a reflectir sobre o património como bem das comunidades e testemunho da sua história – edifícios públicos como bancos, prisões, tribunais, escolas, hospitais, moinhos, passos da via sacra ou casas particulares – ou como exemplo de movimentos arquitectónicos de determinadas épocas quer no sentido da evolução da habitação, quer no sentido do aproveitamento dos espaços públicos e sociais. "Património arquitectónico mas não são só os grandes símbolos da nação", explica João Vieira, Coordenador do Departamento de Informação Biblioteca e Arquivo do IHRU.
"Património Arquitectónico é aquele que determinada comunidade valoriza, num dado momento, não só por razões artísticas e estéticas, mas também históricas, tecnológicas, funcionais, simbólicas e identitárias.
No fundo, a noção de património tem muito a ver com a perspectiva que determinada pessoa ou comunidade tem sobre determinado objecto ou testemunho, o valor que tem para si.
" Esta é a linha que guia a escolha dos imóveis, conjuntos urbanos e paisagens a catalogar.
O inventário é considerado pelos seus responsáveis "uma ferramenta técnico-científica" que origina informação e conhecimento, logo, preservação.
"A partir do momento em que damos às comunidades informação sobre aquele objecto arquitectónico, já estamos a contribuir para que aquela entidade, aquele conjunto de pessoas, tenha consciência do valor daquele objecto com que se cruza todos os dias", nota João Vieira. Esta catalogação responsabiliza as entidades envolventes para o esforço de conservação. "É uma ferramenta eficaz de protecção", ainda que sem valor jurídico.
Hoje estão catalogados no SIPA cerca de 30 mil registos das mais diversas tipologias arquitectónicas.
Encontram-se também os registos dos mais de 3 mil objectos classificados pelo Estado português, incluindo os considerados pela UNESCO como património da Humanidade. Só disponíveis na internet estão cerca de 350 mil fotografias e 200 mil desenhos em grande formato e 12 milhões e meio de páginas textuais dos processos. E, mais recentemente, a enriquecer esta dimensão patrimonial, estão também os espólios pessoais de cerca de 20 dos mais importantes arquitectos portugueses, que passaram a fazer parte dos arquivos do SIPA.
"Este sistema de informação sobre arquitectura é garantidamente o mais importante do país, para além de constituir uma referência a nível internacional", refere João Vieira.
Do terreno à internet
Para proceder à inventariação e arquivo, o SIPA dispõe de uma equipa multidisciplinar de cerca de 30 elementos. Parte da equipa é composta por especialistas em determinada área geográfica, outra por especialistas em determinado aspecto da arquitectura (barroco, arquitectura do século XX, pintura mural, por exemplo). As perspectivas geográfica e temática cruzam-se para se proceder à escolha dos objectos a ser inventariados. Por vezes, às sugestões da equipa juntam-se propostas dos municípios que já fizeram o trabalho de casa, ou o recurso a bibliografia, nomeadamente monografias regionais.
Nos núcleos urbanos, o SIPA tende a privilegiar os chamados equipamentos sociais pelas mais diversas razões: atingem um maior número de cidadãos na sua função de equipamento colectivo, são, arquitectonicamente falando, edificados fortes que marcam o perfil do núcleo urbano e são, regra geral, edifícios da iniciativa da administração central, o que facilita o acesso às fontes documentais, importantes na recolha de informação.
Além disso, o património público não interfere directamente com a privacidade das pessoas, que o SIPA faz todos os esforços para preservar.
Escolhido o objecto, os técnicos fazem uma campanha de inventariação no terreno. Estuda-se, fotografa-se e recolhe-se material que documente o edifício (fotografias antigas, desenhos, plantas, ou qualquer outro material que permita refazer a história do objecto) que ateste toda a sua vida: construção, restauro, ampliação e remodelação. Trazem-se para o arquivo os documentos que comprovam as transformações ao longo dos anos. A partir daqui, o trabalho segue dois rumos complementares.
Um deles, o mais visível, é a ficha de registo textual e fotográfico a que qualquer pessoa pode ter acesso pela internet, através do site do IHRU, pelo endereço http://www.monumentos.pt/Monumentos/forms/000_A.aspx (e usando de seguida o link "sistema de informação").
Aí, já com base na informação tratada, aparecem preenchidos 47 campos, como a "Designação"Localização" ou "Acesso", bem como outra informação mais técnica, como a "Documentação Administrativa" ou o tipo de "Intervenção Realizada". Em suma, estes campos "descrevem o edifício, conjunto, sítio ou paisagem do ponto de vista jurídico, administrativo, técnico, artístico, tecnológico, artístico, etc.".
Em muitos casos, há também acesso a registos fotográficos. Esta base tem sido utilizada pelo público em geral para os mais diversos fins, entre eles o da informação turística.
Mas, o registo de inventário arquitectónico acessível através da internet é apenas "o que costumo apresentar como a ponta de um iceberg", explica João Vieira.
Num segundo nível complementar ao da ficha de informação, "na parte de baixo e a sustentar a parte de cima está a documentação". Com a última reformulação do nosso site, esta segunda componente do SIPA passou também ela a ser disponibilizada via Internet. O responsável pelo SIPA garante que "o nosso sistema de informação tem uma estrutura bastante original em termos de inventários de património arquitectónico do mundo. É um inventário documentado; está sustentado na documentação".
Toda esta informação e documentação pode ainda ser consultada pelo público, em modo mais detalhado, no edifício do Forte de Sacavém.
O processo de inventário e arquivo faz-se em colaboração. O inventariante recolhe a documentação –em arquivos locais e nacionais – e procura no próprio arquivo do SIPA se já existe alguma informação
digitalizada ou em formato papel sobre o objecto.
Reunida a informação, o arquivista encarrega-se depois de recuperar os documentos que necessitam de restauro, digitalizar a informação (apenas aparece on-line aquela que não é passível de ferir a privacidade dos cidadãos) e arquivar os documentos em depósitos próprios para o efeito.
Se não restam dúvidas quanto à importância do espólio do SIPA, João Vieira procura agora que este seja exemplar em dois aspectos: na aproximação ao público e na necessidade desse mesmo público alargar o seu próprio conceito de património. Para isso, o site da internet entrará em breve em remodelação, de forma a tornar-se mais atraente e acessível e outras iniciativas estão também em fase de arranque como os "Kits património", guias práticos a lançar no Programa Simplex, em iniciativa conjunta com o Ministério da Cultura.
Estas e outras medidas estão ligadas à necessidade de alargar o conceito de património para uma ideia mais vasta. Deverá ser aquilo que para cada um representa parte da sua história, da história da sua cidade, do seu bairro. Aliás, as escolhas dos técnicos podem parecer surpreendentes. Quer ver? Aceda ao site do SIPA, procure a sua localidade, a sua rua. Pode ser que se cruze todos os dias com património, já identificado, inventariado e arquivado.
E se a sua casa, uma casa na sua rua ou perto do seu local de trabalho fossem património?


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