José Sócrates não consegue viver sem inimigos. Depois do Presidente da República, do PSD, dos "mercados" e do FMI, esta semana arranjou um novo: os jornalistas que têm a impertinência de fazer perguntas sobre a crise. Na conferência de imprensa que deu no fim do Conselho Europeu, levantou o dedo, bateu com a mão na mesa e acusou os repórteres que o questionavam de estarem "do lado dos especuladores" e de "pretenderem apenas enfraquecer a posição portuguesa".
Se este exercício delirante de autoritarismo fosse feito apenas em São Bento, não haveria grandes problemas, uma vez que os portugueses já se habituaram a dar-lhe uma importância relativa. Mas, desta vez, estavam na audiência jornalistas estrangeiros, que seguramente tomaram este comportamento exótico como mais uma demonstração de fraqueza de um Governo que está a esgotar a sua capacidade de resistência.
O ministro das Finanças também tem ajudado a criar essa imagem de desespero. Depois de ter passado os últimos anos a garantir que os contribuintes portugueses não pagariam 1 cêntimo por causa do resgate do BPN, admitiu agora que, afinal, é preciso cobrir um buraco de 2 mil milhões de euros. Não o fez num ataque súbito de sinceridade - fê-lo pressionado pelo Eurostat, que, por causa de truques como este, obrigará Portugal a rever a previsão do défice. Além do BPN, os prejuízos das empresas públicas de transporte levarão esse valor para 8%, sendo que o Governo tinha falado em 7,3% e, depois de uma execução orçamental "extraordinária", reduziu esse valor para uns surpreendentes 6,9%.
Como se vê, a colecção de inimigos imaginários do Governo não pára de crescer. O mais desejado, porém, ainda terá de esperar. Para já, tem que lhe obedecer, mas se a chanceler Merkel continuar a ser derrotada nas eleições no seu país e a perder força política, José Sócrates não hesitará em juntá-la à lista de aliados do FMI.
A Direcção
(In Editorial da Revista Sábado nº361)
Nota: Este editorial foi publicado também em alemão, sob o título "Was Merkel nicht über Sócrates weiss". A chanceler Merkel não sabe que o primeiro-ministro precisa de inimigos para sobreviver e que, logo que possível, vai juntá-la à lista de aliados do FMI. Fica aqui o aviso também em alemão.(sic).
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