O Governo não gosta de concursos, nem de hastas públicas. Demoram tempo, dão muito trabalho e podem suscitar reclamações e recursos contenciosos. A jornalista Rosa Pedroso Lima reporta, no último "Expresso", que 100 instalações de repartições de finanças vão ser "vendidas", por ajuste directo (com consulta a um único "interessado") à "Estamo - Participações Imobiliárias, S.A." , uma empresa que, embora o seu site o não mencione - é de capitais públicos e está vocacionada para a compra ao Estado ou a Outros Entes Públicos e a privados de imóveis para revenda, para arrendamento ou para alienar após acções de promoção e valorização imobiliária dos mesmos.
O Estado propõe-se "vender" a uma empresa do próprio Estado, que depois vai revender a entidades públicas e privadas, por 105.946.457 euros, um conjunto de bens imóveis, cujo preço merece, desde logo, sérias dúvidas e que propicia a gestão danosa em empresas públicas, que, nos últimos anos, tem transpirado para a opinião pública. E não venham dizer que os bens em causa foram objecto de avaliação, se é que a houve. Há vários tipos de avaliação e esta é função do rendimento do imóvel e não tem o valor rigoroso que transparece do valor da transacção. Sabemos que não há avaliação consensual e quem determina o valor efectivo de um bem é o mercado. Todos temos a noção da disparidade entre a avaliação do nosso automóvel ou do nosso apartamento e o respectivo valor no acto da transacção.
A tal Estamo, depois, vai revender os bens imóveis, a entidades públicas ou privadas por que preço ? Na maior parte dos casos, os imóveis têm sido revendidos sem mais-valias ou com pequenas margens de lucro, sendo o maior comprador da Estamo a própria Estamo, através de um fundo de investimento próprio que tem o monopólio do arrendamento imobiliário ao Estado. Se acrescentarmos que a tal empresa de capitais públicos é deficitária (resultado do exercício negativo de 5,3 milhões de euros, no último relatório e contas), ficamos com mais um flash pouco abonatório da gestão pública.
E quanto à transparência e ao cumprimento das leis - que se é exigível aos cidadãos, é, por maioria de razão, imperativa para o Estado e seus agentes, incluindo o Governo - este tipo de gestão, não configurará uma "institucionalização" e prática continuada do negócio simulado ou do negócio consigo mesmo, previstos nos artigos 240º e 261º do Código Civil ?
Acenando a bandeira da poupança, extinguiram-se, no âmbito do PRACE, organismos (como a Direcção Geral do Património e a DGEMN), que cuidavam com algum rigor do património imobiliário público, e substituiram-se pelo vazio e por empresas públicas (e de capitais públicos) deficitárias.
Assim vai o Estado de Direito e a gestão da cousa pública.
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